vendredi 18 novembre 2011

LINHA 181

Um motorista degolado acelera o ônibus das 23:00 h
Pátios desamparados e lojas fechadas 
encaram meus olhos revestidos de placas de vidro
Sinto que pedaços de sono latejam em mim
Meu estigmatismo borra de coágulos de postes
a imagem escuras de pombos insones:
parecem ratos que aprenderam a voar como morcegos.
Por cima de nós, como um satélite soviético:
uma lua cor de zinco que não posso ver.
O caminho já me conhece e me suga em linha reta
tudo incensado pela respiração do distrito industrial
Deixo-me cair em algum lugar da inconsciência
e a napa das poltronas bebe meu suor
Fecho a janela dos olhares e sonho durante meio quilômetro:
e no sonho eu era uma chapa de ferro
mas que voava como um pato silvestre até chegar em casa

mardi 1 novembre 2011

Saudade

minha saudade é esta masturbação de calendários
os respingos de esperma quarando nos lençóis
é tua voz rouca pregada nas telhas
dizendo as narrativas dos teus gestos
minha saudade é um abraço de aço
das mãos da ausência: minha saudade é um buraco
este açude estagnado no meio da sala
e eu sou a canoa que navega nesta insônia

lundi 12 septembre 2011

ou

ou um botão de liga/desliga
ou uma chave de fenda

ou uma vírgula na gramática dos aços
ou uma nuvem de lítio
ou uma chuva caindo do céu de lítio
ou um parafuso prata
ou uma corrente de motocicleta
ou um cartão batendo
ou uma chapa soldada no Porto de Suape
ou eu

samedi 3 septembre 2011

Latitudes

meus tênis ainda guardam as digitais
de uma criança chinesa
as transversais marcas do solado
deixam suas tatuagens de baixo-relevo
na garganta seca dessas ruas tropicais
olhado de cima, pela íris de um satélite
o ponto preto na estria do mapa
nem imprimem minha foto
nos algarismos do senso demográfico
e a mão do menino chinês
ainda aperta meus cadarços
a sujeira de suas unhas
(as sujidades das latrinas de Xiamen)
entre os nomes em inglês
e essa mão vai arrastada pelo Cais de Santa Rita
eu e meu menino chinês, mãos dadas
pelo mundo globalizado

jeudi 1 septembre 2011

De Cajueiro Seco a Joana Bezerra


bichos sentam
educados macacos
realçam até sobrancelhas
escutam musica new age
reparam
reparam
avião pousando no Aeroporto dos Guararapes
moscas
alguns rezam
crucifixo de plástico ao pescoço
gripados, talvez
um comprimido de deus
ou de ácido ascórbico
macacos doentes enlouquecem
mas o metrô continua em 80/h
as poças de mangue
certos bichos não olham
gostam de óculos lilás
reparam
reparam
quadriláteros amputam o recife
na cadeira quarenta e sete:
fêmea de óculos e farda
de aliança ao pescoço, séria
macaco de maquiagem
ela vai e o metrô chega
também vou:
ornitorrinco trabalhador

 

um mulher que cura


para desintoxicar esta noite
a luz da imagem dela
sol lilás
o rosto
ofusca-se postes
os olhos dela
quebrando escuros
ela passa
um cometa
distorcendo horas
estrela
transforma minha órbita
entravando a ligeireza
e a doença
do doente mundo ligeiro 
pedaços de lágrimas velhas
como pus das lembranças
minha cabeça,
nos chumbos minutos
das quinze horas,
é só hematoma
lateja
essas dores-pensamento:
o sorriso dela (ela é muito bonita)
três segundos antes de me beijar


Para esquecer
para matar o câncer da lembrança
tomo um gole de poesia antibiótica

samedi 20 août 2011

Acadêmicos

X
questão 45
verdadeiro
X
F
V
falso
blocado
V
um cérebro de diploma
V
questão 72
F
último período
V
um homem-diploma







visão

nossos olhos, silicone puro
capturam o fel estético
qualquer sorriso patético
de um rosto contra o muro


meu olhos, teus olhos, uma cegueira
cada visão desabrocha uma dor
cada solidão uma preta cor
até no fundo da córnea derradeira


cores artificiais comem retinas
arco da íris de fuligem crua
cílios espanando poeira de rua
zelando as cápsulas de serotonina 



Kritisa

hoje, sou teu, Kritisa
dá cá teu braço
afugenta meu cansaço 
teu beijo de brisa


dá cá teu colo, Kritisa
apaga varizes de dor
seus raios de torpor
terremoto que suaviza


com minhas mãos vagueio
teu corpo na explosão
toda farta alucinação
dos ávidos teus seios


Kritisa, hoje teu sou
viajante, te espero
esperante, te quero
e hoje, contigo vou






Walter

Walter, você
1) entornou o vinho
2) cortou as cordas da guitarra
3) arrumou palavras às poesias inauditas
4) usou guarda-chuva quando o céu distribuía as nuvens
5) foi a conurbação enquanto flores murchavam
6) matou seu sono no terceiro capitulo do sonho
7) assassinou os personagens no meio dos seus contos
8) apagou as velas das orações
9) Estraçalhou a garganta dos poetas
10) Ordenou saques aos bosques azuis
11) Escreveu seus dez ou doze mandamento
Depois, quando sua missão cumpriu-se
12) Você, Walter, morreu, sem despedidas
E ainda era segunda-feira


touceiras de gente e farda
esperam
...
metrôs 
...
esperam
...
trens
...
esperam
...
ônibus
...
esperam
...
a morte
uma barcarola

mercredi 17 août 2011

mulheres semi-nuas
cruas
roupas cruentas
parca poesia
corpo
sem melodia
ordinária rima
aberta
abertamente 
flor arregalada
baldia
pétala fria
semi-rosa
semi-mulher

Olhos de dentro

os meus olhos de dentro
não querem beber
nem mergulhar
na poeira de fuligem
os meus olhos de dentro
não escutam buzinaços
não leem placas
os meus olhos de dentro
sujos de meus carbonos
das minhas tintas
enlameados nas minhas grotas

dimanche 14 août 2011

Sêmen de Silício

a noite dói nos olhos
e vende-se muitos óculos
a saliva já arde
na hora do beijo
queima a língua


apenas abraços eletrônicos
masturbações digitais
sussurros entre eu e jaqueline maria
anunciados pelas placas telefônicas
e quando gozamos:
sêmen de silício 

jeudi 11 août 2011

Em Gaíbu

A acidez azeda do iodo
dissolve a infraestrutura
da minha vontade
entupido de verde-mar
o tempo continua, sei
brutas rochas
pesadas como âncoras
rasgando espinha de ondas
construindo as sintaxes
de cada dia
e o navio passa
trazendo coisas e levando gente
levando gente e trazendo coisas
misturadas
aqui
fico
como o navio não fica
como os homens não ficam
aqui fico
como meu corpo não fica
minha rebeldia é olhar o mar

04/08/2011

Chegamos
aqui o mundo caga seu metabolismo
a estação é como uma rosa se escancarando:
pétalas de ferro, gente, roupas, mucosas de sal 
as intestinações do orgânico sistema de aço  
se desata entre os ângulos da multidão
veias no cimento da urbe
como a imagem nauseabunda do Capibaribe
galopando ao redor de um ônibus
como um tiro de pistola 
e camadas de sol entortam pescoços
e pesam sobre os encéfalos 
bisturi nos olhos
reclames de sabão, detergente, água sanitária
molestam minhas sujeiras íntimas






samedi 6 août 2011

ROTINA

rotina
diário de páginas repetidas
rotina
rota já conhecida pelos pés
rotina
vida esquecida na avenida
rotina
vida de único viés
rotina
tem a cor da conurbação
rotina
tinge tudo de nada
rotina
tinge até a visão
rotina
de textura pré-fabricada
rotina
quando sou sem ser
rotina
eu que passa sem ver
rotina
coração calado pelo buzinaço
rotina
fundição do homem ao aço
rotina

LOMBRADO

artificiais caminhos
na casca da cabeça
uma imensa vontade
de enfiar um pau
na vagina do sol

(pensamentos da des-razão
a-razão
ou quem sabe
no solo da raiz da razão)

medo?
tive muitos
hoje, meu medo é uma criança

hoje, minhas reflexões estão mudas
embaraçadas no derramamento de luz
de fumaça
de vinho
no pote do cérebro 

ESTRANHAMENTO

quero me desnudar de meu humano
despojar-se dos atributos
herdados da bruta forma da vida ordinária
olhar novamente a lua
e ver que ela mudou desde a última menstruação
olhar os próprios culhões
e perguntar sobre o esperma que um dia fui
perguntar sobre o útero que estuprei

A MADRUGADA DE 26 DE JULHO

1:00
nem mesmo um aborto de poesia
1:30
rasgo papéis pesados de borrões
1:31
hoje não é madrugada em que amadureça versos
2:00
inútil ler livro, inútil pensar na mulher que se apagou após o desquite, inútil masturbação inútil
3:00
o escuro cansa os olhos, se coagulo na cabeça, acendo a lâmpada
3:01
fico tonto com a luz que fere
3:03
piso numa barata, nos estouramos como se fossemos de plástico, tomo um leite também de plástico, branco como uma barata que vomita
3:15
Arrulhar, gato sobre pombos, pombos sobre telhado, gato sobre gato, ladrar de cães que agouram os gatos, motocicletas e luzes que buzinam, um homem, eu, debaixo da onomatopéia da insônia
3:30
Poesia possível: imagem parda de barata, pombo, gato, cães, homens, carros, grilos de concreto, a fauna insone que anunciam ou mesmo invade o quarto do sonho.  

APRESENTAÇÃO

risco seu plástico
sou de aço
sou de atos
todo drástico
coração de ácido
olhos de crânio
mijo sal
e enferrujo o titânio
da cruz do natal 

mardi 5 juillet 2011

tenho-a tão perto
beijar seu cheiro
puxar-lhes os cabelos
mordidas na voz
na pele,
ela tem uma cor que me arde
me clama
estamos no mato e somos lobos
animais aos tragos
rugidos entre segredos banais
eu, ela, agora
apaguem a luz

lundi 4 avril 2011

o que é literatura?
não sei
Nem quero saber.
evade-se de mim
um bicho inquieto
com quem joga estrelas
no firmamento magro
O RAP que eu deveria cantar

Seguindo no caminho
entre sonhos de moinho
pela senda de aço
beirando homens de plástico
discurso bombástico
pixo seu ouvido com o RAP que faço
a façanha de estar vivo
ao vivo e na minha cor
a cor que sofre o clivo
a dor escorre no suor
debaixo do verão
a urbe arde em febre
em cima do chão
o recife segue sua verve
modula as rotinas
nos ângulos das esquinas
raízes de concreto
nascem na boca de um homem
macaco de piche no seu andar ereto
se desfaz no ar, seus atributos somem 

vendredi 4 mars 2011

Depois

derramo um pote de estrela
sobre teu corpo
enquanto toco uma canção
nas flautas dos teus seios
meus dedos dançam
no íntimo de tuas curvas
me amarro
em seus longos negros cabelos
entre as saliências do vento
enquanto sonho
dormimos para matar o mundo
das nossas ausências

Poesia do Novo

Estou cansado de verbos gastos
orações mofadas
saturado das burocráticas linguagens
Adjetivos injustificáveis
e inúteis
Estou cansado das matemáticas do pensamento

Quero a libertação
ação livre da larva subterrânea
do meu ser sem palavras
As falas dos homens não mais servem
Não dizem mais as coisas minhas